Estou num barco à deriva que me consome a vida. As ondas levam-me para longe, calando-me com a sua bravura, e quando a calma chega, já se fez dia, sobre uma noite mal dormida. Há dias em que os começos e os fins são iguais. Quem me dera ser poeta e escrever um poema sobre tudo o que isto me faz sentir, mas as rimas interpelam-se-me umas às outras e só consigo trancar-me em verso, para jamais me armar de novo, em poetisa mal amada e sem destino a que remar.
Há um lado oposto a todo este sufoco de não se ser ou de não se saber. Já estive de outro lado, as coisas parecem más, mas só quem por aqui passa sabe, que estar lá é das melhores coisas. Sou livre para navegar em busca de algum lugar, porém tão presa a mim, que não me mexo e deixo que me levem ao próximo patamar.
Tudo vai-se-me devorando, os planos vão-se cancelando, o mar vai-me ignorando, como quem não finge não ver um intruso em seu lar, por pena. Vai-me deixando permanecer na sua casa, servindo-me dela, enquanto tento descobrir que rumo posso dar a uma vida coberta de tragédia, solidão e erros. Se ao menos soubesse formular uma frase, dir-te-ia que isto não me faz sofrer, que nada sinto, que estou em paz. Só que a cada noite, a dor se torna maior, o aperto no meu peito insuportável, a garganta seca de tanto permanecer em silêncio. A minha alma em alvoroço vai-me ditando e ordenando, enquanto permaneço surda e sigo feito muda.
Vento que corre sem hesitar, leva-me para um lugar, onde possa ficar. Deixa-me navegar em ti, para longe daqui e das memórias que carrego. Deixo-me à deriva em ti, na busca de um pouco de paz, porque aqui tudo se revolta contra mim.
Para onde vou? Saberei quando lá chegar. Por enquanto, continuo por aqui, ignorando os versos que escrevi, sobre um dia de bonança, onde pela primeira vez, nada em mim doeu ou ardeu. Prossigo à deriva, só que já não tão perdida. Até que a vida consegue ser bonita, vista daqui.
2 Comentários
Há alturas em que, simplesmente, devemos ir. Mesmo que não saibamos o destino. Porque é uma forma de nos desafiarmos, de conhecermos outras rotas, de nos descobrirmos
Fez-me tanto sentido o que escreveste. Por vezes, o melhor caminho mesmo é ir. Temos de ir, pelo nosso próprio bem.